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São Paulo, março de 2021
Valéria Motta*
O ano de 2020 mostrou, em grande escala, como as circunstâncias podem mudar de uma hora para outra. Para as empresas, o isolamento social em razão da pandemia trouxe desafios imensos para a gestão de pessoas. As histórias bem-sucedidas e de dificuldades que vivenciamos e conhecemos nesse tempo de incertezas comprovam que promover o bem-estar é uma via de sucesso para as empresas enfrentarem obstáculos e permanecerem abertas a novos modelos.
O cenário brasileiro não é dos mais fáceis. Além do temor de uma doença pouco conhecida e que pode ser fatal, enfrentamos a ameaça do desemprego, que em 2020 subiu mês a mês, chegando a uma taxa de 14,4% em outubro – o que equivale a 13,8 milhões de brasileiros desempregados, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além disso, a atividade econômica em vários setores desacelerou e empresas tiveram que reduzir salários e jornada, o que contribuiu para a sensação de instabilidade e medo.
Dados como esses, ainda mais em um período tão atípico, evidenciam as várias dificuldades que as pessoas enfrentam. As características da pandemia do coronavírus tornam alguns grupos ainda mais vulneráveis, seja pela idade ou pelas condições sociais que resvalam em questões como saúde, moradia e acesso à infraestrutura. Todo esse quadro ajuda a colocar em perspectiva os desafios do gestor de pessoas diante dos profissionais sob sua reponsabilidade e da sociedade onde estão inseridos. O social invadiu o individual e a gestão de pessoas precisou ampliar e aprofundar seu olhar.
Entre as alternativas para se adequar às medidas restritivas, o trabalho remoto foi uma das principais opções para aqueles que tiveram condições de adotá-lo. Essa transição foi brusca para a maioria das pessoas e causou mais problemas, afinal, a troca do escritório pela casa esbarrou em obstáculos como encontrar um espaço apropriado no lar e ter ferramentas como hardware, software e conexão de internet para acessar os materiais da empresa.
Uma nova variável foi acrescentada à rotina da gestão de pessoas: acompanhar como a mudança de rotina afetava não apenas o desempenho e o desenvolvimento profissional, mas principalmente a saúde mental e física das pessoas. Nesse cenário, muitas empresas tiveram a oportunidade de comprovar que demonstrar empatia com os colaboradores, mesmo com ações muitos simples, é importante para manter o bem-estar.
Em nossa empresa, por exemplo, o case da Dona Ira ilustra isso. Atuando como copeira na matriz há 15 anos, ela é querida por todos. Com a pandemia, precisou se afastar do convívio da equipe, assim como os demais colegas. Com seus 67 anos, Dona Ira aderiu ao home office. Como forma de manter unido um time que estava separado pela distância, surgiu o Café Online da Dona Ira. Duas vezes por semana, os colaboradores realizam uma chamada de vídeo para que as pessoas conversem e compartilhem suas experiências, como faziam diariamente na copa durante as jornadas na empresa, no horário do café.
Todos saem desses breves encontros semanais mais animados, sorridentes, leves e com a certeza de que realmente têm valor para a organização e para seus pares. Como vemos, não há dúvidas de que adaptar para o universo online importantes premissas do trabalho presencial, como o reconhecimento e o sentimento de pertencimento, é um compromisso indispensável dos gestores para manter a equipe coesa nesses tempos.
Assim como o Café Online da Dona Ira, existe uma variedade de iniciativas possíveis para aumentar o bem-estar. Ações que demonstrem solidariedade e empatia geram aproximação e promovem uma cumplicidade saudável de cuidado e atenção para com o outro. Do ponto de vista corporativo, o incentivo a tais atitudes e práticas aumenta o engajamento, o espírito de equipe e a certeza de que o afeto é uma dimensão da nossa existência necessária dentro das organizações, pois fortalecem e sustentam laços para além das responsabilidades e compromissos profissionais.
A dedicação dos profissionais nesse momento e todo o feedback recebido nessa nova realidade nos ajudam a traçar estratégias futuras. Nesta época difícil que aproximou trabalho e vida pessoal, as ações focadas no bem-estar reforçam nossa humanidade e revelam novas forças. Parafraseando o refrão de uma canção do cantor e compositor Criolo** em versão adaptada: “existe amor nas organizações”.
* Diretora de Recursos Humanos da Hughes do Brasil
** Referência à música “Não Existe Amor em SP”.
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